26.12.11

Restos mortais

Fruto de uma fase onde o bloqueio criativo era apenas mais um sintoma. Eu transcreveria esse texto e mudaria uma série de coisas. Mas como saiu, assim quase psicografado, fica um pouco mais autêntico. 
Da série: para desenvolver e aprofundar, no sentido formal e subjetivo. 


Vende-se uma alma.
Vendo se há alma.
Pesando perdas, ganhos e inércia.
Paro e tento recordar:
Onde estarão os demônios que enterrei?
Conto os sete palmos e cavo para libertá-los.
Qual cova?
Minha mente é cúmplice desse esquecimento.
Não quer dar-me a pá.
Quer vendar meus olhos e brincar de cabra-cega.
De onde você veio?
Saiu de mim. Não quer voltar.
Meus anjos.
Voaram longe sem as asas.
Caíram no mesmo túmulo que eu então cavava.
E joguei terra sobre suas preces.
Qual terra?
Quantos passos contarei?
Qual direção seguir?
É de dentro pra fora.
A ação. A reação.
De fora pra dentro.
Meu caminho. Meu mapa.
Está tudo aqui comigo.
Sou a terra, o túmulo, a cova.
Você enxerga minha pedra tumular.
Você lê o meu epitáfio.
Mas não pode ver além. 
Deposite suas flores.
Acenda uma vela.
Faça uma oração.
Antes que eu liberte meus demônios e dê asas aos meus anjos. 

24.12.11

Do livro [ou o primeiro post]

O texto a seguir é um pequeno recorte de uma espécie de diário que faço desde o começo da minha adolescência. Nele escrevo desde simples desabafos até teorias que levei dias a fio para desenvolver. Talvez sejam coisas que só façam sentido em minha cabeça. Ou podem soar familiares para quem estiver lendo.
Este, em particular, é parte de uma série de sincronicidades que me fazem, cada vez mais, querer compartilhar essas linhas com quem conquistou esse direito - e alguém cujo livro também tem me proporcionado uma ótima leitura.



***

          Você está lendo essa linha? Não é qualquer um que tem o privilégio de fazê-lo. Poucos  chegaram até aqui. Pode não parecer grande coisa à primeira vista. Mas é único. É meu. Compartilhar contigo não é fácil. Longe disso. É penoso abrir o livro e deixar que alguém o leia – em sua melhor forma gramatical ou em seu pior erro de sintaxe. Mas mostrar somente as belas passagens seria como ler um livro sem final. Os deslizes fazem completa a minha obra, por mais incompleta que ela ainda se apresente.
          Perdoe-me pelo excesso de reticências. Minha hesitação se mostra presente quando meu silêncio não é capaz de dizer mais do que minhas palavras. As aspas saem tortas quando não há quem citar, não há parâmetro para me guiar. Desculpe-me pela redundância, a vontade de me fazer entender a todo custo. Ignore a dislexia, tente compreender por tudo aquilo que significa, não por letras dispostas com esmero. Não esqueça das notas de rodapé; aquilo que se apresenta em texto pode significar muito mais do que você imagina. Não há sinopse para preparar, nem índice para guiar. Descubra, linha por linha, pacientemente, aquilo que me toma ainda mais tempo para colocar em palavras.  
          Não brado aos quatro cantos a epopeia do meu íntimo. Mas é nesse sussurro ao pé do ouvido em que te entrego em mãos um poder que nem você imagina que tem. Simplesmente por ter me cativado. Independe do que leio em seus relatos. O que é meu, posso dividir com quem quer que seja. Mesmo que, quem me leia, não escreva nada para me mostrar. Só me resta ter a esperança de que compreenda o meu vocabulário, sem linhas trocadas ou vírgulas desperdiçadas. E esperar para que, um dia, também possa virar a página do seu livro.